Espelho, espelho meu...

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Coelho branco na neve.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

rasgo

O Limite da Decepção
(ou A Percepção das horas, dos sonhos idos e do amor que nunca foi amor porque não havia a quem amar.)



Esta noite sonhei um sonho de eras passadas, daquilo que nunca foi um dia. Sonhei num sonho de risos e bocas, de felicidade tênue e tímida como um breve raio de sol que se arrisca após uma tempestade. Sonhei um sonho que antes sonhava acordada, sem saber que sonhava...

Pode parecer poesia - não é. É reflexo da alma perturbada, conturbada com o descobrimento advindo desse sonho tão bonito e traiçoeiro; porque, com o devaneio, percebi, encontrei e enfrentei meu maior inimigo.
Não ele; nunca ele. Pois ainda que se passem eras, é meu dever sublime e inalterável defendê-lo e assumir por ele as culpas que eu mesma possa lhe atribuir. Porque não é ele o meu inimigo; sou eu. Eu, que o criei e nutri e guardei. Eu, que velei seu sono por noites a fio; que cuidei e acarinhei, achando que era tudo o que ele precisava quando não era nada do que ele queria; eu, que fiz do coração, tripas. Porque ele?, ah, ele é e sempre foi e sempre será uma mera projeção dos meus anseios torturados. Ele, que nunca existiu.
Existiu, sim, uma pessoa, simples coadjuvante que perdeu com o tempo o significado; um ser de carne, osso e vontades ao qual meu coração insidiosamente atrelou aquele espectro do que eu esperava que ele fosse. No qual minha mente intransigente e estúpida acreditou encontrar todas as respostas. Mas não é esse homem real, mal chamado homem, que me prende e castra. Me encontrei e me encontro sob o jugo impiedoso de outro: ele, aquele a quem criei e nutri e guardei. Aquele a quem amei e amo com intensidade tal que dilacera a carne trêmula, ofegante e ainda fresca. Aquele cuja esfera de poder e opressão enlaça meu pescoço e me estrangula, dia após dia, como uma coleira muito apertada que tem por motivo prender, trancar, aprisionar, manter cativo para sempre meu coração estúpido e traidor. Mas a coleira já há muito não embota mais os pensamentos, não mantém refém a mente; e a mente, mexeriqueira cínica e mordaz, conta agora ao coração que ele, aquele ele a quem amávamos, não passa de ilusão - de encanto fugidio que engana e ri aos brados de nossa estupidez. Ah, coração!, pobre coração envergonhado. Tantos anos, tantos sonhos, tantos risos... Era tudo mentira? Ah, triste, triste coração que se partiu...

Mas, espere...!

Ao partir-se, mil partes de um coração escapam do laço sinistro e caem ao chão como estrelas mortas, o tilintar como chuva sobre as pedras do caminho, aquela chuva de tanto tempo atrás. Uma coleira não é capaz de prender um coração partido. Antes houvesse sido uma rede...

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

metamorphosis

Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Filosofia

O mundo me condena

E ninguém tem pena

Falando sempre mal do meu nome

Deixando de saber

Se eu vou morrer de sede

Ou se vou morrer de fome.



Mas a filosofia

Hoje me auxilia

A viver indiferente assim.

Nesta prontidão sem fim

Vou fingindo que sou rico

Para ninguém zombar de mim.



Não me incomodo

Que você me diga

Que a sociedade

É minha inimiga.

Pois cantando neste mundo

Vivo escravo do meu samba

Muito embora vagabundo.



Quanto a você

Da aristocracia

Que tem dinheiro

Mas não compra alegria

Há de viver eternamente

Sendo escrava desta gente

Que cultiva hipocrisia.



Grandes Citações

2010 foi um grande ano.

Sobre os amores, basta dizer que houveram. Encontrei e da mesma forma pensei perder grandes amores, apenas para perceber que Lavoisier sabia demais, ao menos em parte: nada se perde; as coisas simplesmente tomam outra forma. Especialmente em se tratando de um sentimento tão puro e sublime, não há força capaz de fazê-lo perecer.


Let me not to the marriage of true minds
Admit impediments. Love is not love
Which alters when it alteration finds,
Or bends with the remover to remove:
O no! it is an ever-fixed mark
That looks on tempests and is never shaken;
It is the star to every wandering bark,
Whose worth's unknown, although his height be taken.
Love's not Time's fool, though rosy lips and cheeks
Within his bending sickle's compass come:
Love alters not with his brief hours and weeks,
But bears it out even to the edge of doom.
If this be error and upon me proved,
I never writ, nor no man ever loved.
De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera,
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante,
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfange não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma para a eternidade.
Se isso é falso, e que é falso alguém provou,
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.


Sobre o resto, eis o que resta a dizer: aprendi o valor da paciência; entendi que as coisas têm seu próprio tempo; tempo este que, aliás, passa mais rápido do que gostaríamos; que devemos aproveitar o mesmo tempo ao máximo e passá-lo sempre que possível com aqueles que nos amam, talvez mais do que com aqueles que amamos. Aprendi que devemos aprender a gostar daquilo que nos engrandece, que nos completa (por mais tentador que possa parecer amar aquilo que queremos amar, ainda que esse "aquilo" nos diminua. (Aliás, aprendi que não se deve mentir para si mesmo. Não, NÃO compensa. E não vai compensar amanhã, nem depois de amanhã; não vai compensar nunca. A situação não vai mudar. As coisas não vão se resolver sozinhas. Você não vai sair do lugar a menos que se levante e saia do lugar).). Finalmente compreendi que meu relógio não gira no mesmo ritmo que o da vida - talvez até girem em sentidos opostos! -, e que não há muito o que fazer quanto a isso. Pode ser que eu esteja quebrada; pode ser que o resto do mundo é que não funcione bem; pode ser que eu e o resto do mundo sejamos, simplesmente, muito diferentes.


De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.


De mais a mais, percebi que não há muito o que fazer quanto a isso, exceto o óbvio: é imperioso e necessário que se faça algo. Termino este desabafo com provavelmente a pior citação que virei a fazer na vida:


Corpus omne perseverare in statu suo quiescendi vel movendi uniformiter in directum, nisi quatenus a viribus impressis cogitur statum illum mutare.

Todo corpo continua em seu estado de repouso ou de movimento uniforme em uma linha reta, a menos que seja forçado a mudar aquele estado por forças aplicadas sobre ele.



2010 foi um grande ano: nem por isso foi um ano bom, e nem por isso foi um ano ruim. A grandeza não se limita, não se conforma e, definitivamente, não se apaga da memória com facilidade. O grande o é por méritos não julgados; somente o é. E esse foi, com certeza, um grandecíssimo ano, que (a mim, pelo menos) me pareceu o mais curto de toda a minha vida.

Talvez 2011 não seja um ano tão grande como o que passou. Ficaria até muito aliviada, se não fosse. Tenho apenas um desejo para o ano que começa:

que seja um bom ano, para todos nós.








Bem-vindo, 2011. E a todos, o meu mais sincero "muito obrigada".